Barreto / Nemo | Romancistas Essenciais - Lima Barreto | E-Book | www.sack.de
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E-Book, Portuguese, Band 16, 260 Seiten

Reihe: Romancistas Essenciais

Barreto / Nemo Romancistas Essenciais - Lima Barreto


1. Auflage 2020
ISBN: 978-3-96858-608-3
Verlag: Tacet Books
Format: EPUB
Kopierschutz: 6 - ePub Watermark

E-Book, Portuguese, Band 16, 260 Seiten

Reihe: Romancistas Essenciais

ISBN: 978-3-96858-608-3
Verlag: Tacet Books
Format: EPUB
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Na coleção Romancistas Essenciais o crítico August Nemo apresenta autores que fazem parte da história da literatura em língua portuguesa. Neste volume temos Lima Barreto, um jornalista e escritor que publicou romances, sátiras, contos, crônicas e uma vasta obra em periódicos, principalmente em revistas populares ilustradas e periódicos anarquistas do início do século XX. A maior parte de sua obra foi redescoberta e publicada em livro após sua morte por meio do esforço de Francisco de Assis Barbosa e outros pesquisadores, levando-o a ser considerado um dos mais importantes escritores brasileiros. Não deixe de conferir os demais volumes desta série! Essa obra inclui: - Triste Fim de Policarpo Quaresma. - Isaías Caminha.

Afonso Henriques de Lima Barreto, mais conhecido como Lima Barreto (Rio de Janeiro, 13 de maio de 1881 Rio de Janeiro, 1 de novembro de 1922) foi um jornalista e escritor que publicou romances, sátiras, contos, crônicas e uma vasta obra em periódicos, principalmente em revistas populares ilustradas e periódicos anarquistas do início do século XX.

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I
A tristeza, a compreensão e a desigualdade de nível mental do meu meio familiar agiram sobre mim de um modo curioso: deram-me anseios de inteligência. Meu pai, que era fortemente inteligente e ilustrado, em começo, na minha primeira infância, estimulou-me pela obscuridade de suas exortações. Eu não tinha ainda entrado para o colégio, quando uma vez me disse: Você sabe que nasceu quando Napoleão ganhou a Batalha de Marengo? Arregalei os olhos e perguntei: Quem era Napoleão? Um grande homem, um grande general... E não disse mais nada. Encostou-se à cadeira e continuou a ler o livro. Afastei-me sem entrar na significação de suas palavras; contudo, a entonação de voz, o gesto e o olhar ficaram-me eternamente. Um grande homem!... O espetáculo de saber do meu pai, realçado pela ignorância de minha mãe e de outros parentes dela, surgiu aos meus olhos de criança, como um deslumbramento. Pareceu-me então que aquela sua faculdade de explicar tudo, aquele seu desembaraço de linguagem, a sua capacidade de ler línguas diversas e compreendê-las, constituíam, não só uma razão de ser de felicidade, de abundância e riqueza, mas também um título para o superior respeito dos homens e para a superior consideração de toda a gente. Sabendo, ficávamos de alguma maneira sagrados, deificados... Se minha mãe me aparecia triste e humilde - pensava eu naquele tempo - era porque não sabia, como meu pai, dizer os nomes das estrelas do céu e explicar a natureza da chuva... Foi com estes sentimentos que entrei para o curso primário. Dediquei-me açodadamente ao estudo. Brilhei, e com o tempo foram-se desdobrando as minhas primitivas noções sobre o saber. Acentuaram-se-me tendências; pus-me a colimar glórias extraordinárias, sem lhes avaliar ao certo a significação e a utilidade. Houve na minha alma um tumultuar de desejos, de aspirações indefinidas. Para mim era como se o mundo me estivesse esperando para continuar a evoluir... Eu ouvia uma tentadora sibila falar-me, a toda a hora e a todo instante, na minha glória futura. Agia desordenadamente e sentia a incoerência dos meus atos, mas esperava que o preenchimento final do meu destino me explicasse cabalmente. Veio-me a pose a necessidade de ser diferente. Relaxei-me no vestuário e era preciso que minha mãe me repreendesse para que eu fosse mais zeloso. Fugia aos brinquedos, evitava os grandes grupos, punha-me só com um ou dois, à parte, no recreio do colégio; lá vinha um dia, porém, que brincava doidamente, apaixonadamente. Causava com isso espanto aos camaradas: Oh! Isaías brincando! Vai chover... A minha energia no estudo não diminuiu com os anos, como era de esperar; cresceu sempre progressivamente. A professora admirou-me e começou a simpatizar comigo. De si para si (suspeito eu hoje), ela imaginou que lhe passava pelas mãos um gênio. Correspondi-lhe à afeição com tanta força d’alma, que tive ciúmes dela, dos seus olhos azuis e dos seus cabelos castanhos, quando se casou. Tinha eu então dois anos de escola e doze de idade. Daí a um ano, saí do colégio, dando-me ela como recordação, um exemplar do "Poder da Vontade", luxuosamente encadernado, com uma dedicatória afetuosa e lisonjeira. Foi o meu livro de cabeceira. Li-o sempre com mão diurna e noturna, durante o meu curso secundário, de cujos professores, poucas recordações importantes conservo hoje. Eram banais! Nenhum deles tinha os olhos azuis de D. Ester, tão meigos e transcendentais que pareciam ler o meu destino, beijando as páginas em que estava escrito!... Quando acabei o curso do Liceu, tinha uma boa reputação de estudante, quatro aprovações plenas, uma distinção e muitas sabatinas ótimas. Demorei-me na minha cidade natal ainda dois anos, dois anos que passei fora de mim, excitado pelas notas ótimas e pelos prognósticos da minha professora, a quem sempre visitava e ouvia. Todas as manhãs, ao acordar-me, ainda com o espírito acariciado pelos nevoentos sonhos de bom agouro, a sibila me dizia ao ouvido: Vai, Isaías! vai!... Isto aqui não te basta... Vai para o Rio! Então, durante horas, através das minhas ocupações quotidianas, punha-me a medir as dificuldades, a considerar que o Rio era uma cidade grande, cheia de riqueza, abarrotada de egoísmo, onde eu não tinha conhecimentos, relações, protetores que me pudessem valer... Que faria lá, só, a contar com as minhas próprias forças? Nada... Havia de ser como uma palha no redemoinho da vida - levado daqui, tocado para ali, afinal engolido no sorvedouro... ladrão... bêbado... tísico e quem sabe mais? Hesitava. De manhã, a minha resolução era quase inabalável, mas, já à tarde, eu me acobardava diante dos perigos que antevia. Um dia, porém, li no "Diário de" que o Felício, meu antigo condiscípulo, se formara em Farmácia, tendo recebido por isso uma estrondosa, dizia o "Diário", manifestação dos seus colegas. Ora Felício! pensei de mim para mim. O Felício! Tão burro! Tinha vitórias no Rio! Por que não as havia eu de ter também - eu que lhe ensinara, na aula de português, de uma vez para sempre, diferença entre o adjunto atributivo e o adverbial? Por quê!? Li essa notícia na sexta-feira. Durante o sábado, tudo enfileirei no meu espírito, as vantagens e as desvantagens de uma partida. Hoje, já não me recordo bem das fases dessa batalha; porém uma circunstância me ocorre das que me demoveram a partir. Na tarde de sábado, saí pela estrada fora. Fazia mau tempo. Uma chuva intermitente caía desde dois dias. Saí sem destino, a esmo, melancolicamente aproveitando a estiada. Passava por um largo descampado e olhei o céu. Pardas nuvens cinzentas galopavam, e, ao longe, uma pequena mancha mais escura parecia correr engastada nelas. A mancha aproximava-se e, pouco a pouco, via-a subdividir-se, multiplicar-se; por fim, um bando de patos negros passou por sobre a minha cabeça, bifurcado em dois ramos, divergentes de um pato que voara na frente, a formar um V. Era a inicial de "Vai". Tomei isso como sinal animador, como bom augúrio do meu propósito audacioso. No domingo, de manhã, disse de um só jato à minha mãe: — Amanhã, mamãe, vou para o Rio. Minha mãe nada respondeu, limitou-se a olhar-me enigmaticamente, sem aprovação nem reprovação; mas, minha tia, que costurava em uma ponta de mesa, ergueu um tanto a cabeça, descansou a costura no colo e falou persuasiva: — Veja lá o que vai fazer, rapaz! Acho que você deve aconselhar-se com o Valentim! — Ora qual! fiz eu com enfado. Para que Valentim? Não sou eu rapaz ilustrado? Não tenho todo o curso de preparatórios? Para que conselhos? — Mas olhe, Isaías! você é muito criança... Não têm prática... O Valentim conhece mais a vida do que você. Tanto mais que já esteve no Rio... Minha tia, irmã mais velha de minha mãe, não tinha acabado de dizer a última palavra, quando o Valentim entrou envolvido num comprido capote de baeta. Descansou alguns pacotes de jornais manchados de selos e carimbos; tirou o boné com o emblema do Correio e pediu café. — Você veio a propósito, Valentim. Isaías quer ir para o Rio e eu acabo de recomendar que se aconselhasse com você. — Quando você pretende ir, Isaías? indagou meu tio, sem surpresa e imediatamente: — Amanhã, disse eu cheio de resolução. Ele nada mais disse. Calamo-nos e minha tia saiu da sala, levando o capote molhado e logo depois voltou, trazendo o café. — Quer parati, Valentim? — Quero. Revolvendo lentamente o açúcar no fundo da xícara, meu tio continuou ainda calado por muito tempo. Tomou um gole de café, depois um outro de aguardente, esteve com o cálice suspenso alguns instantes, descansou-o na mesa automaticamente e, aos poucos, a sua fisionomia de largos traços de ousadia, foi revelando um grande trabalho de concentração interior. Minha mãe nada dissera até aí. Num dado momento, pretextando qualquer coisa, levantou-se e foi aos fundos da casa. Ao sair fez a minha tia uma insignificante pergunta sobre o arranjo doméstico, sem aludir à minha resolução e sem despertar meu tio da cisma profunda em que se engolfara. Ansioso, deixei-me ficar à espera de uma resposta dele, notando-lhe as menores contrações do rosto e decifrando os mais tênues lampejos de seu olhar. Houve um segundo que ele me pareceu ter suspendido todo o movimento exterior de sua pessoa. A respiração como que parara, tinha o cenho carregado, as rugas da testa larga e quadrada fixadas, como se tivessem sido vazadas em bronze, e os olhos imóveis, orientados para uma fresta da mesa, brilhantes, extraordinariamente brilhantes e salientes, como que a saltar das órbitas, para farejar o rasto provável da minha vida na intrincada floresta dos acontecimentos. Gostava dele. Era um homem leal, valoroso, de pouca instrução, mas de coração aberto e generoso. Contavam-lhe façanhas, bravatas portentosas, levadas ao cabo, pelos tempos em que fora, nas eleições, esteio do partido liberal. Pelas portas das vendas, quando passava, cavalgando o seu simpático cavalo magro, com um saco de cartas à garupa, murmuravam: "Que songa-monga! Já liquidou dois..." Eu sabia do caso, estava mesmo convencido de sua exatidão; entretando, apesar das minhas precoces exigências de moral inflexível, não me envergonhava de estimá-lo, amava-o até, sem mescla de terror, já pela decisão de seu caráter, já pelo apoio certo que nos dera, a mim e a minha mãe, quando veio a morrer meu pai, vigário da freguesia de . Animara a continuar meus...



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